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sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

A PONTE


Antes era só o precipício.
É verdade que ainda havia um longo caminho até ele,
mas onde eu iria chegar senão ao perverso precipício?
Não há retorno, nem atalhos (atalhos para quê?).
Quando se escolhe um caminho, ou se é escolhido por ele,
o tempo te diz: Vai, anda, e não olha para trás!
Vai construindo tua vida.
Se te aventuras em caminhos fáceis
é provável que a trilha se alongue
e o terás por companheiro somente ele, o tempo,
numa paisagem vazia, onde sopram ventos mornos.
Eu comecei uma trilha assim,
mas aos poucos fui ficando entediado, absorto, e sem me dar conta,
numa bifurcação qualquer da vida, me perdi.
Seguindo o conselho do tempo,
não olhei para trás.
Sobressaltos, tristeza e solidão, foram me moldando
e criando profundezas dentro de mim.
A casca grossa dos pés, a pele ressequida e a expressão de fera na face
me davam a impressão de um animal.
Os modos rudes, antissociais, me fizeram atração circense.
Foi onde fiz alguns poucos amigos, poucos, muito poucos.
Os da minha juventude (na juventude fazemos amigos)
não os via mais, mas estavam na minha mente,
tentando mantê-la sã...
Caminhava para o precipício
quando surgiu uma ponte, por acaso, do nada.
Ainda não a atravessei, porque, às vezes, parece que vai ruir.
Às vezes, pressinto estar no começo,
outras, me sinto no fim.
Não há retorno, me diz o tempo.
Nem adianta olhar para trás.

Ney Cohen

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