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terça-feira, 24 de fevereiro de 2009


Recebi, no dia 14 de fevereiro, a mensagem e poesia da Adina Bezerra.

É uma singela homenagem a sua filha, que revela não só a maturidade da Rose, quanto mulher, mas também, na nossa percepção, o amadurecimento da Adina, quanto poeta.


Parabéns à aniversariante e à poeta.


"Hoje uma ROSA(E) completa 23 anos, esta é uma flor-sorriso que Deus permitiu florescer em meu jardim.
PARABÉNS FILHA!"


MINHA ROSE-FLOR

Recebi um dia um botão
Em seu primeiro abrir
Da tímida rosa
Eu vi surgir a cor do amor...
Sua forma exótica
Leva-me ao caminho do sol
Fazendo brilhar dias
De sombras que nunca quis
Hoje é o meu poema maioridade
Esperança de um porvir
Da moça sorriso saudade
Minha Rose-flor floresce feliz.

Adina Bezerra
14.02.09 11:40
Belém Pará

Os Dons da poesia

Roberto Malvezzi, Gogó *

"O camelo que não passa pelo fundo da agulha,
Costuma entrar pelas portas das catedrais". (Casaldáliga)

É raríssimo um bispo poeta. Aliás, a linguagem poética é muito rara na história da Igreja. Predomina a racionalidade filosófica, teológica, discursiva, embora na Bíblia ela esteja tão presente. O prólogo do Evangelho de João é - ao menos para mim - o poema religioso mais belo que já se escreveu.
No papado, então, apenas João Paulo II tinha um viés poético. Fora ator na juventude. Deixou uma frase que é a senha para os cristãos dos tempos atuais: "é preciso rastrear as digitais de Deus impressas no Universo". Pura poesia.
Comemoramos cem anos de Dom Helder, o poeta. Seus versos curtos, no estilo dos Hay Kay dos japoneses, são capazes de dizer em poucas palavras o que outros gastariam uma tese de quinhentas páginas para dizer. O outro poeta bispo, Casaldáliga, continua no meio de nós, capaz de fazer versos estonteantes como esse da epígrafe. Contei essa poesia no encontro das Pastorais Sociais do CELAM. A reação dos presentes, inclusive bispos, foi uma gargalhada despudorada.

"Para que contradizer a criança
Segura de ter nas mãos uma varinha de condão?
Que ela crê ser invisível ao dizer "abracadabra"?
Se ela crê nessa magia que é dizer "abracadabra"?
Mas, para que maior castigo
Do que não ter senso poético
Ou não ter imaginação"? (D. Helder)

Esses homens fizeram de suas vidas uma oração, de suas falas um verso de fina e simples poesia. Mas, a poesia só existe onde reina o olhar lúdico sobre a vida. Onde o amor é visível, a beleza admirada, a compaixão é vivida e até a morte é irmã, quanto mais o mal de Parkinson.

"Querer ficar na memória dos homens
É tão inútil quanto procurar
Nas ondas de hoje
Os sinais das ondas de ontem". (D. Helder)

Mas, os Dons do amor e da poesia permanecem para sempre.

* Agente Pastoral da Comissão Pastoral da Terra

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Esse lixo


Era eu o menino deitado sujo na calçada da manhã ao lado do quartel
Por isso me condoia.
O vazio que sentia era a fome do menino sujo deitado junto a outros dois meninos.
Os outros dois meninos também era eu
E o mal-estar que sentia era o sujo do menino
E o calafrio que sentia era o frio do menino
E o sufoco que sentia era o fedor do menino
Que me impregnava...
Eu estou fisgado e não adianta me debater
O anzol sangra em minha goela
Deus me domou e agora sou seu cordeiro
A baioneta dos anos decepou meu braço
E eu não vou mais à guerra
O meu verso caduco, de verdade,
Não quer mais remexer esse lixo
Ney Cohen

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Vista-se


Vista-se,
Hoje é sexta-feira, não é dia de feira
Veste o teu melhor vestido, o prostíbulo de espera
Não adianta chorar, estás acostumada e
és amada por muitos homens
E eu sou teu amor preferido de
Uma dor que nem dói no coração
Agora achas graça, a tua graça
Não comove o meu bolso
Só o salário que a chama
Jamais vai apagar a
Tua prostituição
Vista-se,
Já é domingo
Precisamos rezar por
Nossa humilde alma
Que a sociedade faz com
Gente como a gente Operário e
Prostituta
Ficamos agora a morrer à beiradas
Da incompreensão, na qual o são
Não veio do sal e mais
Do mar e sim viemos do
Um nada
Vista-se, é segunda-feira



Alberto Abadessa

Aquário

Se transparecer que te amo
___________________
cristal
______________que te faço menina
________________________
puella
______________que te adoro
____________________
principessa
______________que me encantas
_____________________
dja
______________que me seduzes
_____________________audaz
João Bosco

A PONTE


Antes era só o precipício.
É verdade que ainda havia um longo caminho até ele,
mas onde eu iria chegar senão ao perverso precipício?
Não há retorno, nem atalhos (atalhos para quê?).
Quando se escolhe um caminho, ou se é escolhido por ele,
o tempo te diz: Vai, anda, e não olha para trás!
Vai construindo tua vida.
Se te aventuras em caminhos fáceis
é provável que a trilha se alongue
e o terás por companheiro somente ele, o tempo,
numa paisagem vazia, onde sopram ventos mornos.
Eu comecei uma trilha assim,
mas aos poucos fui ficando entediado, absorto, e sem me dar conta,
numa bifurcação qualquer da vida, me perdi.
Seguindo o conselho do tempo,
não olhei para trás.
Sobressaltos, tristeza e solidão, foram me moldando
e criando profundezas dentro de mim.
A casca grossa dos pés, a pele ressequida e a expressão de fera na face
me davam a impressão de um animal.
Os modos rudes, antissociais, me fizeram atração circense.
Foi onde fiz alguns poucos amigos, poucos, muito poucos.
Os da minha juventude (na juventude fazemos amigos)
não os via mais, mas estavam na minha mente,
tentando mantê-la sã...
Caminhava para o precipício
quando surgiu uma ponte, por acaso, do nada.
Ainda não a atravessei, porque, às vezes, parece que vai ruir.
Às vezes, pressinto estar no começo,
outras, me sinto no fim.
Não há retorno, me diz o tempo.
Nem adianta olhar para trás.

Ney Cohen

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

A POESIA NO PODER 2


Continuando o tema da Poesia e o Poder, vemos que a poesia no Brasil conseguiu atingir o ápice do nosso judiciário, o STF. Abaixo, transcrevo matéria em que Carlos Ayres de Britto, ministro do Supremo Tribunal Federal, fala da necessidade dos magistrados brasileiros lerem poesia "para entender mais a realidade da sociedade". Essa matéria foi publicada no dia 23 de janeiro de 2009, durante a realização do Fórum Mundial de Juízes, ocorrido em Belém.

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Ayres Britto diz que juízes precisam ler mais poesia Agência Brasil BELÉM - Ao abrir, nesta sexta-feira (23) à noite, em Belém, o Fórum Mundial de Juízes, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Carlos Ayres Britto, fez um apelo para que os magistrados brasileiros atuem com sensibilidade e comprometidos com a justiça social.“Os juízes precisam ler mais poesia, romances e jornais para entender mais a realidade da sociedade”, disse Britto no evento, que reúne mais de 700 magistrados do Brasil e de outros países. O encontro faz parte da programação do Fórum Social Mundial, que será realizado na capital paraense a partir de terça-feira (27).Em uma palestra sobre O STF e os 20 Anos da Constituição, Britto destacou a atuação da Corte Suprema do país em temas polêmicos e que tem reflexos diretos na vida da população. “O Supremo Tribunal Federal, uma casa essencialmente conservadora, se deparou com uma Constituição avançada, antecipadora de fatos, valores e costumes, e enfrentou dificuldades para interpretá-la. Nos últimos anos, porém, o STF tem adotado posturas mais avançadas”, disse o ministro.Ele citou exemplos dos julgamentos da aposentadoria espontânea, da fidelidade partidária, do nepotismo e das células-tronco feitos pela Corte. Ayres Britto ressaltou a proximidade que vem ocorrendo entre a população e o STF. Nesse sentido, Britto disse que a imprensa tem cumprido papel fundamental e que a TV Justiça – que transmite ao vivo os julgamentos da Casa – se tornou "um mecanismo de controle externo" do STF. “Hoje, os ministros sabem que precisam prestar contas à sociedade”, afirmou.No fim de sua palestra, Ayres Britto foi homenageado com um voto de aplauso de todos os participantes do fórum pelo parecer no julgamento da constitucionalidade da demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. O autor da proposta, senador José Nery (PSOL-PA), afirmou que o ministro "brindou o país com um voto pela cidadania

A POESIA NO PODER

Juiz gaúcho escreve sentença em forma de poesia

CAROLINA FARIASda Folha Online
Um juiz da Turma Recursal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul decidiu variar e elaborou um acórdão (decisão sobre recursos judiciais) em forma de verso.
Coube ao juiz Afif Jorge Simões Neto, 49, analisar um pedido de recurso de uma ação indenizatória por danos morais. Um homem de Santana do Livramento, no interior do Estado, moveu a ação por ter se sentido ofendido com um pronunciamento feito na Câmara do município. O réu da ação teria dito no pronunciamento que o autor do pedido não teria feito uma prestação de contas à prefeitura.
Em primeira instância, o autor venceu a causa, mas o réu recorreu. O juiz Simões Filho acatou o recurso e julgou o pedido improcedente.
"É um caso que envolvia pessoas ligadas ao tradicionalismo, ao CTG [Centro de Tradicionais Gaúchas]. Como achei que o assunto seria interessante e sei que o gaúcho gosta de verso, de poesia, resolvi fazer essa tentativa", afirmou Simões Neto.
Mesmo em forma de verso, a decisão não deixa de ser o resultado do trabalho de analisar o caso, enfatizou o magistrado.
"Fiz um rascunho e vi que daria. Mesmo que seja em verso, eu tive que fazer uma análise do processo, para analisar a eventual culpa de cada um. Só o verso não basta. Tem que fazer o verso em cima da análise do processo. O verso é a forma, mas tive que fazer a análise do conteúdo no próprio verso", disse o juiz.
Simões Neto tem intimidade com a escrita, além da forma usual sentenças judiciais. Ele afirma que escreve crônicas e tem dois livros publicados, um com suas crônicas e outro da biografia do pai, que era advogado.
"Meu pai quando era advogado fez ao menos duas defesas em verso, que não é o mesmo que uma sentença. Então eu já tinha uma referência em casa e resolvi me aventurar. Até que recebi elogios", afirmou.
O magistrado não teme que sua atitude abra margem para a população ou a comunidade jurídica o considerarem um brincalhão. "É realmente inusitado, que foge do aspecto formal. É que o direito é muito sisudo, estanque. Então resolvi sair dos padrões normais. Eu corro o risco [de não ser levado a sério]. Parece que o rapaz que perdeu a ação achou que foi uma brincadeira. Mas não foi. Julguei de forma séria, como julgo em todos os processos. Apenas o formato foi diferente", disse.
Veja a decisão em verso do juiz gaúcho:

"Este é mais um processo
Daqueles de dano moral
O autor se diz ofendido
Na Câmara e no jornal.

Tem até CD nos autos
Que ouvi bem devagar
E não encontrei a calúnia
Nas palavras do Wilmar.

Numa festa sem fronteiras
Teve início a brigantina
Tudo porque não dançou
O Rincão da Carolina.

Já tinha visto falar
Do Grupo da Pitangueira
Dançam chula com a lança
Ou até cobra cruzeira.

Houve ato de repúdio
E o réu falou sem rabisco
Criticando da tribuna
O jeitão do Rui Francisco

Que o autor não presta conta
Nunca disse o demandado
Errou feio o jornalista
Ao inventar o fraseado.

Julgar briga de patrão
É coisa que não me apraza
O que me preocupa, isso sim
São as bombas lá em Gaza.

Ausente a prova do fato
Reformo a sentença guerreada
Rogando aos nobres colegas
Que me acompanhem na estrada

Sem culpa no proceder
Não condeno um inocente
Pois todo o mal que se faz
Um dia volta pra gente

E fica aqui um pedido
Lançado nos estertores
Que a paz volte ao seu trilho
Na terra do velho Flores."