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segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Eduardo Galeano - O livro dos abraços

A dignidade da arte



Eu escrevo para os que não podem me ler. Os de baixo, os que esperam há séculos na fila da história, não sabem ler ou não tem com o quê.

Quando chega o desânimo, me faz bem recordar uma lição de dignidade da arte que recebi há anos, num teatro de Assis, na Itália. Helena e eu tínhamos ido ver um espetáculo de pantomima, e não havia ninguém. Ela e eu éramos os únicos espectadores. Quando a luz se apagou, juntaram-se a nós o lanterninha e a mulher da bilheteria. E, no entanto, os atores, mais numerosos que o público, trabalharam naquela noite como se estivessem vivendo a glória de uma estréia com lotação esgotada. Fizeram sua tarefa entregando-se inteiros, com tudo, com alma e vida; e foi uma maravilha.

Nossos aplausos ressoaram na solidão da sala. Nós aplaudimos até esfolar as mãos.


A função da arte/1



Diego não conhecia o mar. O pai, Santiago Kovadloff, levou-o para que descobrisse o mar. Viajaram para o Sul. Ele, o mar, estava do outro lado das dunas altas, esperando.
Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas alturas de areia,
depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus olhos. E foi tanta a imensidão do mar, e tanto seu fulgor, que o menino ficou mudo de beleza.
E quando finalmente conseguiu falar, tremendo, gaguejando, pediu ao pai: — Me ajuda a olhar!

Eduardo Galeano em O livro dos abraços

II Prêmio Literário Canon de Poesia 2009

O concurso cultural denominado II Prêmio Literário Canon de Poesia 2009 é promovido pela Canon do Brasil Ind. e Com. Ltda, pessoa jurídica estabelecida na cidade de São Paulo, inscrita no CNPJ sob o nº 046.266.771/0001-26, pela Fábrica de Livros e pelo Grupo Editorial Scortecci, para autores brasileiros, maiores de 16 anos, residentes no Brasil. Conta com o apoio institucional do Portal Amigos do Livro.

Tem por objetivo descobrir novos talentos, promover a literatura e difundir a impressão digital de livros no Brasil. Este concurso é exclusivamente de cunho cultural, sem qualquer modalidade de sorte ou pagamento pelos concorrentes, estando aberto à participação de todos que assim o desejarem, sendo promovido pela empresa de acordo com a Lei n. 5768/71 e Decreto 70.951/72.

INSCRIÇÕES:

Inscrições: Até 15 de setembro de 2009 e deverão ser feitas somente pela Internet através do Portal Concursos e Prêmios Literários. AQUI.

Relação dos Inscritos: AQUI

Não há necessidade da poesia ser INÉDITA.

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sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Poemas sobre a fé - Constâncio Negaro

Estive lendo a Cronópios e de lá retirei estes poemas. São versos sobre a fé, a fé que transpassa o sentido da religiosidade rasa e se aprofunda em questões humanas, desejos reprimidos, amor carnal, dúvidas...
Leiam!



intróito
jaculatória
ladainha
secreta
súplica
encaixe...

Deus!
falamos mesmo do sacro
ou a fé não passa de uma metáfora?

Sons

sexta-feira
é dia de coral
eu nos sons que vêm da rua
mas a musicalidade
que sai de minha boca é sacra
e mistura-se ao hálito de homens
que se acreditam anjos

Anjos

à noite
cada um entra em sua cela
túmulo de gestos obscenos e ejaculações noturnas
cedo
junto ao ar morno do sexo reprimido que vaza pelas frestas
das portas
anjos saem soerguidos como os amantes de um quarto
de motel
e atravessam o longo e frio corredor com trajes negros
e femininos – cruz no peito
seguem na direção do confessionário

Ângelus

ao amanhecer
: ângelus
ao meio-dia
: ângelus
ao anoitecer
: ângelus
na madrugada
os corpos pedem o pecado
: Marias, Marias, Marias...
: Josés, Josés, Josés...

Animal

para fazer respeitar o celibato
há de se castrar a alma, não o falo
e se não há alma
não passaremos de animais selvagens
a gozar o mundo
como o mundo deve ser gozado...
 livre de qualquer Deus

............................
Constâncio Negaro, 58 anos, natural do agreste, atualmente vivendo em São Paulo, admirador dos milagres de padre Cícero, saiu de sua terra, como muitos jovens para estudar em colégio religioso.
E-mail: constancio.negaro@gmail.com
 
Ver mais..... http://www.cronopios.com.br/site/poesia.asp?id=4163

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

À OPINIÃO PÚBLICA

Lúcio Flávio Pinto * 
Adital -

Em solenidade na qual comemorou seus 30 anos de fundação, na semana passada, em Brasília, a Associação Nacional de Jornais apresentou uma relação com 31 casos de censura à imprensa praticados nos últimos 12 meses no Brasil, sendo 16 decorrentes de decisão judicial. O levantamento podia ser considerado completo ou, pelo menos, satisfatório, se não tivesse omitido a censura judicial imposta ao "Jornal Pessoal", quinzenário que edito em Belém do Pará há 22 anos, pelo juiz da 4ª vara cível do fórum de Belém, Raimundo das Chagas Filho, no dia 6 de julho.
Ver texto completo ---->  http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=40705

Tratado acerca das flores

A Confraria d'A Cova dos Poetas comemora no próximo ano dez anos de existência. Dois mil e dez - 2000 e 10 - dois números cabalísticos. Essa Confraria, fundada oficialmente em 2000, a partir do lançamento do seu 1º livro - A cova dos poetas -, surgiu com a ideia de dar vazão a uma produção literária engavetada por anos, de pessoas comuns, obscuras até: funcionários, operários, engenheiros, odontólogos, atendentes, agrônomos... A cada novo lançamento, novos autores a ter seus quinze minutos de fama. E o que é mais importante: uma produção literária vindo à tona, boiando e sobrevivendo num rio imenso - Pará - de turbulências e profundidade enormes, onde quem não dá pé e não tem pique pra nadar e nadar acaba se afogando. E quem não se afogou, gostou, ficou e tá aí até hoje, comemorando conosco o lançamento do quinto livro - Tratado acerca das flores - o terceiro de poesia. São seis autores, três confrades reminiscentes (Alberto Abadessa, João Bosco e Ney Cohen) e três confrades convidados (Adina Bezerra, Walcyr Monteiro e Heliana Barriga), e aproximadamente 70 poemas, que poderão ser lidos em outubro (previsão não otimista).

Estamos todos convidados. Então, vamos brindar!


CIO
Adina Bezerra

Acordo inquieta na madrugada
Não compreendo o que quero
Sinto meu corpo incendiar
Parecem chamas do inferno
Na intensidade do calor
Um forte cheiro exala
Oriundo de minhas entranhas
Percebo-me devassa
Sinto-me uma leoa no cio
Querendo sua presa alcançar
No encanto - magia de bicho
Em verde mata a decantar.

 


A TINTURARIA FICA EM FRENTE À CASA
Alberto Abadessa

A tinturaria fica em frente à casa
Às 19 horas uma bela mulher
Fica despida, seio ereto
Olhos virtuosos
Lábios carnudos
Vê em frente à tinturaria e a
Delícia dos meus olhos
Tento telefonar, não telefono.
Tento gritar de um sexo
Desesperado
Não grito
Sou um covarde
Não resta a menor dúvida do
Covarde, o que faço?
Líquido, som,
A insensatez de dormir
Esperando
A tinturaria fechar
Na noite seguinte...




Pobre é o pé - a planta racha à fome e à fé                 Heliana Barriga
A palma e pobre e aclama forte
À contramão jurando sobre
Pobre cobre o corpo
O papelão
              Pobre é a pá
             Asa abortada
             Fechada ao elevador
Rodoviária porto metrô coreto praça
A rua é minha casa
Minha extensão e graça!
Pobre é o pênis
A derramar pobres meninos
Perdidos podres prostrados
Pobre é o pensar
            De poucos
                    À progressão
                                De pobrestação.



 
O QUINTO LADO DO QUADRADO

Ney Cohen

Eu sou o quinto cavaleiro do apocalipse
Vago sob a quinta lua em eterno eclipse
Na quinta estação do ano hiberno.
E sonhos me revelam segredos dos céus e inferno.

 Sou eu o quinto dos elementos naturais
O ideal ponto quinto dos cardeais
Detrás da quinta lua de Júpiter assisto
O conflito cósmico entre Io e Calisto.


Eu sou o quinto ícone animal do oriente
Com asas de fogo, o quinto ser vivente
O humano quinto erro nitzscheniano
Fardo humano, demasiado humano

 Sou eu o quinto santo evangelista
A quinta-essência niilista
Sobre a quinta letra do deus morto blasfema
O verso quinto, a quinta estância desse poema.
 
 
Origem, voltar-me

João Bosco
          Foi criança
               numa mulher
                      adolesceu desconhecido
                      adolescente na beleza
                                          na mulher
                      adolescente na beleza
                                          da mulher que amava
                                                                  sorria
                                          de esperança
                                          de indiferença


               Encantado, não vacilou
                                         mergulhou
                     até esvaziar a enchente
                                         plenitude
                                                    o amor

               Abandonado, não arriscou
                                     não desejou
                   esvaziou o que era plenitude
                                     não era
                                                    o amor



NO RIO DE MEUS AMORES


Walcyr Monteiro


          Maria caiu
          No rio de meus amores
          Nada, Maria, nada!


                                                 Maria afogou
                                                 No rio de meus amores
                                                 Nada, Maria, nada!


Maria saiu
Do rio de meus amores
Viva, Maria, viva!


                                        Que aconteceu
                                        No rio de meus amores?
                                        Tudo, Maria, tudo


                                                          Nada, Maria, nada


           No rio de meus amores
           Maria foi quase tudo
           Maria foi quase nada


O que ficou
No rio de meus amores?
Tudo, Maria, tudo


                                Nada, Maria, nada!