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sábado, 21 de maio de 2011

POESIA MARGINAL - CHACAL




A idade faz mal aos olhos. Em compensação encorpa a voz. Nossas paranóias da juventude se transformam em tiques nervosos. O tempo é fundamental para você adensar sua obra, capinar seu caminho de pregos e espinhos. depois de um tempo, é só juntar tudo, colocar num saco, jogar fora e virar vilão de teatro infantil. Mmmoooouuuuhhhhh!!!!!
Chacal




O carioca Ricardo Carvalho Duarte, ou simplesmente Chacal, completa 60 anos em 2011. Já se pode dizer “um senhor idoso”, mas com a mesma cabeça fervilhante do menino dos vinte anos que lançou, em 1972, o seu primeiro livro de poemas Muito Prazer, Ricardo, produzido em mimeógrafo (lembram disso?) e distribuído de mão em mão, características marcantes da poesia marginal surgida nos anos 70.

Para conhecer o poeta e seus pensamentos, sugiro a leitura do artigo Memórias de Chacal: longa jornada poesia adentro, publicado pelo jornalista Luciano Trigo para o site G1.Globo, em que entrevista Chacal pela ocasião do lançamento de seu novo livro, Uma história à margem.

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“UM POETA NÃO SE FAZ COM VERSOS”

o poeta se faz do sabor
de se saber poeta
de não ter direito a outro ofício
de se achar de real utilidade pública
no cumprimento da sua missão sobre a terra
escrevendo tocando criando
o que pesa é não se achar louco
patético quixote inútil
como quem fala sozinho
como quem luta sozinho
o que pesa é ter que criar
não a palavra
mas a estrutura onde ela ressoe
não o versinho lindo
mas o jeitinho dele ser lido por você
não panfleto
mas o jeito de distribuir
quanto a você meu camarada
que à noite verseja pra de dia
cumprir seu dever como água parada
fica aqui uma sugestão:
- se engavete com os seus sonetos
porque muito sangue vai rolar e não
fica bem você manchar tão imaculadas páginas.


O BEIJO

todo mundo precisa de beijo
o ascensorista a vitrinista
o judoca o playboy
o zagueiro o bombeiro o hidrante
o hidrante precisa também
de cuidados água farta
analgésicos e dinheiro
todo mundo precisa de dinheiro
o maracanã o pavilhão de são cristóvão
o cristo a pedra da gávea o dois irmãos
quem não precisa de dinheiro?
todo mundo precisa de beijo


DESABUTINO

quem quer saber de um poeta na idade do rock
um cara que se cobre de pena e letras lentas
que passa sábado a noite embriagado
chorando que nem criança a solidão
quem quer saber de namoro na idade do pó
um romance romântico de cuba
cheio de dúvidas e desvarios
tal a balada de neil sedaka
quem quer saber de mim na cidade do arrepio
um poeta sem eira na beira de um calipso neurótico
um orfeu fudido sem ficha nem ninguém para ligar
num dos 527 orelhões dessa cidade vazia


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